Determina a tradição que não há Natal sem pinheiro enfeitado, sem
Pai Natal e sem prendas. Mas, contrariando a ideia de que as tradições são
quase intemporais e praticamente imutáveis, nem sempre foi assim.
S. Nicolau de Guimarães e o da Coca-cola.
(Gerada por IA)
No Natal dos tempos que correm, o protagonista deixou de ser o
Menino Jesus. Foi substituído pelo Pai Natal, um velho com longas barbas
brancas, de barriga proeminente, faces rosadas e fato vermelho, criado em 1920
por uma agência de publicidade para a Coca-Cola, com o propósito de incrementar
as suas vendas durante o inverno. Na origem, estava a figura de Santa Klaus,
Saint Nicholas ou S. Nicolau, o bispo de Mira do século IV, protetor das
crianças que, na velha Europa, o festejavam no dia 6 de dezembro.
Na sociedade contemporânea, S. Nicolau adquiriu o estatuto de
figura omnipresente do Natal globalizado que, despojado da sua dimensão
religiosa, é hoje celebrado por povos de todas as partes e de (quase) todas as
crenças. E não há centro comercial onde não apareça: desapossado da sua
humanidade simples, austera e generosa, o santo foi transformado em ícone da
sociedade de consumo.
Por sua vez, a tradição do pinheiro enfeitado poderá ter origem
nas Saturnálias, festas que os romanas organizavam em calendário quase
coincidente como do Natal dos cristãos. A sua associação às festividades da
quadra natalícia terá surgido por volta do século XVI, na Alemanha, de onde se
espalharia pelo resto da Europa. No século XIX, a árvore de Natal foi
introduzida nos Estados Unidos. As prendas que se trocavam eram penduradas nos
seus ramos ou colocadas à sua volta.
Entre nós, o Pai Natal e o pinheiro de Natal são tradições de
importação recente. Chegaram a Guimarães quando o século XX já ia bem andado.
Muito tempo depois dos estudantes terem começado a festejar S. Nicolau e a
erguer o Pinheiro.
Não sabemos bem há quantos séculos os académicos de Guimarães
celebram S. Nicolau, padroeiro das crianças e, por extensão, dos estudantes. Se
os documentos conhecidos mostram que já o comemoravam no século XVII, a
tradição deverá ser bem mais antiga. Mas é seguro que, nas primeiras décadas do
século XIX, as celebrações já apresentavam um figurino próximo do atual, em que
é impossível ignorar os elementos que se cruzam com os festejos do Natal dos
nossos dias.
Se hoje o Pinheiro, o mastro anunciador das Festas Nicolinas, se ergue
despido de adornos, antigamente, era enfeitado com as “ofertas ao Pinheiro” e
as prendas arrecadadas nas Posses — o número do programa festivo que Raul
Brandão descreveu magistralmente nas páginas de “A Farsa” —, que seriam
partilhadas com os que comparecessem ao magusto. E as prendas, figuras centrais
dos natais dos tempos modernos, estão também na distribuição das Maçãzinhas, os
frutos pequenos e rosados que integram a iconografia do santo.
Antes de ser o Pai Natal, S. Nicolau já era dos estudantes de
Guimarães. E continua a ser.
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